Estabelecendo limites nas relações
Quantas vezes você diz sim querendo dizer não? Quantas vezes você faz coisas que não quer fazer apenas para agradar alguém, ser uma pessoa legal, evitar um conflito, ou apenas “deixa pra lá”? Afinal, não tinha tanta importância assim… E de sapo em sapo, logo você está afundado em um brejo de mal-estar, solidão, ressentimento, culpa, estresse, raiva, ruminação de pensamentos e insatisfação com você mesmo e com os outros. Isso tudo acontece porque muitas vezes nós não aprendemos a estabelecer limites nas nossas relações, sejam elas amorosas, de amizade, profissionais, sociais.
O que são limites?
Os limites sempre foram fundamentais para os seres humanos no que se refere a relacionamentos. Sua função sempre foi demarcar, proteger, distribuir o espaço da terra entre os homens. Eles são como uma cerca, uma linha, que define qual é o nosso espaço e qual é o do outro. Nosso próprio corpo estabelece um limite muito claro, do que somos e do que não somos. Nossa pele define essa barreira entre nós e o mundo.
Como falei anteriormente, os limites servem para nos proteger. Se estivermos nos sentindo frágeis e desprotegidos nossos limites também serão frágeis. Algumas pessoas se sentem tão frágeis que tentam se fundir com a outra. A noção de limites está tão prejudicada que perdem a mínima noção de que são seres inteiros e que precisam de espaço para serem elas mesmas. Aliás, algumas pessoas nem tem cerca e deixam qualquer um entrar em suas vidas e montar acampamento. Outras pessoas escondem sua fragilidade construindo em torno de si uma cerca tão alta, que não permite que ninguém se aproxime. Fecham-se no seu território e vivem isoladas em uma fortaleza.
É fundamental aprender a conhecer seus limites e a diferenciar entre limites violados, sem permissão, dos limites permitidos. Como está a sua cerca atualmente? Forte e resistente, protegendo você? Ou frágil e cheia de buracos? Quem você tem permitido entrar no seu espaço? Quem está atropelando você e invadindo o seu espaço? Quem você tem atropelado? Quem ou que você não tem permitido entrar?
Por que é tão difícil estabelecer limites?
Permitimos essas invasões porque a dificuldade de dizer “não”, de estabelecer limites se relaciona na maioria das vezes ao medo de perder o amor do outro, de ser abandonado, rejeitado, de ficar solitário, de perder algo ou alguém, de ser agredido ou de a outra pessoa sentir raiva, de se sentir culpa. Há pessoas que todas as vezes que dizem “não”, sentem-se culpadas. Acreditam que dizer “não” sempre vai provocar dor no outro. Mas a verdade é que muitas dessas pessoas têm dificuldades para lidar com seus próprios “nãos” e acreditam que todas as outras pessoas são assim também. Quando alguém lhes diz “não” acham que o outro não as ama o suficiente e acreditam que toda vez que disserem “não” para alguém estarão comunicando a mesma coisa. Uma das características mais óbvias da dependência emocional é a incapacidade de estabelecer limites.
Há três razões para isso:
- Não nos conhecemos o suficiente para saber o que realmente queremos: pois olhar para dentro de nós mesmos pode ser doloroso, teremos que lidar com nossas falhas e imperfeições e isso nos assusta.
- Acreditamos que não podemos pedir aquilo que queremos: acreditamos que não temos permissão e se pedirmos o que queremos os outros nos acharão egoístas. Não sabemos como pedir.
- Somos dominados pelas nossas emoções: “preciso tomar conta dos outros”, “preciso me justificar”, “se digo o que penso, as pessoas não gostarão de mim”, “os conflitos são sempre ruins”… Pensamentos que estão diretamente ligados a experiências infantis, a emoções não digeridas (culpa, medo, raiva, tristeza, angústia…) que nos paralisam e nos boicotam na hora de estabelecer limites.
Mas como colocar limites?
- Conheça o seu território
Para estabelecer limites é preciso primeiramente conhecer o nosso território. Precisamos saber onde começam e onde terminam as nossas divisas, nossas vontades, desejos, capacidades, gostos. Em suma: o que é nosso e o que é do outro, o que é nosso direito e o que é nosso dever e o que é direito e dever do outro. Precisamos estar dispostos a olhar para nós e para os outros, percebendo-nos e percebendo os outros. Precisamos aceitar que alguns territórios não são para nós e que nunca vamos explorá-los. Outros territórios sempre foram nossos e só precisamos tomar posse. Precisamos aceitar que damos conta de algumas coisas e de outras não. Precisamos entender qual é o nosso espaço e ficar à vontade com ele. Precisamos conhecer o espaço do outro e respeitá-lo.
- Pare de se sabotar
Para isso você precisará saber por quais emoções é dominado. O que paralisa você e faz com que você diga “sim” quando quer dizer “não”? Em quais situações e para quais pessoas é mais difícil dizer “não”? Como essas situações e pessoas se relacionam com as crenças e valores que você traz desde a infância? Que crenças você precisa abandonar para conseguir se permitir dizer “sim” para você mesmo, para acreditar que merece? Com quais emoções você precisa aprender a lidar para conseguir aumentar sua cerca? Identificando e trabalhando esses pontos você será capaz de ser dono da sua vida e do seu território.
- Acredite, você tem permissão!
Para estabelecer limites precisamos acreditar que temos direito a felicidade, a bem-estar, a espaço, que temos direito de ter vontades e desejos e isso não significa necessariamente sermos egoístas. Dar-nos permissão é beber de uma dose de saudável egoísmo!
- Seja coerente
Colocar limites implica ser coerentes conosco mesmos: dizer “sim” quando queremos dizer “sim’ ou quando dizer “sim”, não nos fere, não passa por cima de nossas necessidades. Significa também dizer “não”. Em primeiro lugar dizer “não” para nós mesmos. Por exemplo, para aquilo que nos agride (comer demais, dormir de menos, deixar de fazer atividade física e tantas outras permissões nocivas…) Dominar a si mesmo é o maior desafio de qualquer pessoa. Os limites começam dentro de nós. Se não formos capazes de dizer não para nós mesmos, não seremos capazes de dizer não para os outros.
- Comunique-se
Não é suficiente simplesmente decidir quais são os nossos limites. É preciso comunicá-los aos outros. E essa comunicação precisa ser verbal e não verbal. Precisamos falar e demonstrar quais são os nossos limites. Afinal, ninguém tem bola de cristal para ler os nossos pensamentos e saber o que queremos.
A verdade é que ao estabelecer limites passamos a dizer mais sim para nós mesmos. “Sim” eu mereço tempo, “sim” eu mereço espaço, “sim” eu mereço respeito, “sim” eu mereço ser verdadeiro comigo e com os outros. Quando dizemos não para as coisas que não temos energia ou vontade de fazer, liberamos espaço para nos focar no que realmente desejamos. Quando fazemos algo só para agradar ou para evitar uma briga estamos sendo desonestos conosco mesmos e com os outros. Estamos tirando de nós e dos outros a oportunidade de aprender com a frustração, com o conflito, quem sabe aprender a dialogar…. Os limites garantem segurança para ambos os lados.
Mas como em todo aprendizado, acertaremos e erraremos, vamos conseguir colocar limites em algumas situações e em outras não. O importante é estar consciente disso. E continuar mapeando a que distância ficamos bem, quanto espaço precisamos. E aprendendo a conhecer o nosso espaço e o nosso limite seremos capazes de conhecer e respeitar o limite dos outros.
Adriana Sales Saar – Psicóloga – CRP 06/106843